Clubes brasileiros se arriscam a estourar ‘bolha’ financeira com gastos excessivos
CLUBES BRASILEIROS CAMINHAM PARA ESTOURAR ‘BOLHA’ FINANCEIRA COM GASTOS INSUSTENTÁVEIS
Nos últimos anos, o futebol brasileiro tem experimentado um crescimento acelerado nos investimentos, impulsionado pelo alto patrocínio das casas de apostas e pela injeção de capital das Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs). Entretanto, esse modelo de expansão financeira pode estar criando uma bolha prestes a estourar, colocando em risco a estabilidade dos clubes.
Os altos investimentos também têm provocado uma inflação expressiva nos valores de transações e salários. Na última janela, encerrada na semana passada, mais de R$ 1,5 bilhão foi utilizado na compra de direitos econômicos de jogadores, elevando consideravelmente os custos operacionais dos clubes.
— Eu não sei se a gente está perto, mas a gente está evoluindo para isso [estourar a bolha]. Primeiro, a gente ainda está vendo ela crescer. E aí, de novo, são sempre alguns pilares, algumas coisas que levam a isso. É um aumento brutal da receita de marketing, fruto das bets. Isso é muito claro. O salto de receita e publicidade de patrocínio que os clubes tiveram por conta das bets foi brutal — afirmou o economista César Grafietti, sócio da consultoria Convocados.
O aumento de receitas, ótimo em um primeiro momento, pode se tornar um problema, levando a um modelo de gestão que não se sustenta a longo prazo. Além do aumento nos valores de patrocínio, a chegada das SAFs ajudou a inflacionar um mercado que já estava em expansão.
— Tem um processo para colocar a casa em ordem. Você tem que reorganizar a dívida, investir em infraestrutura, investir em pessoal, fazer a coisa andar, remontar elenco. Isso é um processo que leva dois, três anos para você falar que está redondinho, pronto para crescer. Mas o que os donos fazem? Enquanto eles estão tentando resolver esses problemas todos, eles já saem gastando para contratar porque precisa logo ganhar alguma coisa. Aqueles que não são SAF conseguem subir o salário junto, vão contratar também, senão ficam para trás. E aí você vê todo um inchaço de gastos, seja em contratações ou salários, que muitas vezes não têm lastro. Vai virar dívida, vai se tornar um problema — projeta Grafietti.
É a terceira janela seguida que os clubes nacionais aumentam gradativamente seus gastos. Em 2024, a elite do futebol brasileiro gastou mais de R$ 1 bilhão em cada uma das janelas de transferência, totalizando R$ 2,162 bilhões na temporada. Esses valores não incluem contratações de jogadores que estavam livres no mercado.
— Esses são os dois pontos que fazem com que em algum momento esse serviço fique insustentável. Seja porque os donos não vão ter mais tanto dinheiro para colocar, chega uma hora que você não coloca mais, porque coloca, coloca, coloca e não dá resultado. Seja porque os clubes que estão tentando acompanhar vão quebrar, vão simplesmente ser incapazes de pagar seus custos — analisou Grafietti.
Com a continuidade desse cenário, o futebol brasileiro pode enfrentar consequências graves. Alguns dos principais riscos incluem:
- Clubes falindo: sem fontes de receitas sustentáveis, algumas equipes podem se tornar insolventes.
- Atraso no pagamento de salários: jogadores podem recorrer à Justiça para rescindir contratos e deixar seus clubes gratuitamente.
- Transfer Ban da FIFA: equipes que acumulam dívidas podem ser proibidas de contratar novos jogadores, prejudicando sua competitividade.
Uma solução possível para evitar esse colapso é a implantação de um fair play financeiro. Para Grafietti, essa regulação deveria partir dos próprios clubes.
— A maneira mais óbvia e segura é você se autorregular, né? Se os clubes criaram um fair play financeiro, controlar, enfim, isso é o óbvio, talvez o caminho mais justo para fazer esse ajuste. A CBF, hoje, me parece que não tem interesse em fazer isso. Então, talvez, devesse começar pelos clubes — concluiu.
Com a criação de um órgão independente, os clubes poderiam começar a controlar suas finanças e talvez, no futuro, incluir essa proposta nos campeonatos.
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